terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Gratidão

Filha,

Há alguns meses a mamãe estava sofrendo por conta de um grande dilema. Eu precisava te colocar para dormir no seu quarto, mas não conseguia imaginar dormir sem ter você ao meu lado - no seu berço, mas ao meu lado.

Por alguns meses fui trabalhando a idéia de te migrar pro seu quarto. Questionei amigos, amigas, vovós, médicos, livros, matérias e entrevistas... Sou macho para admitir que estava bem relutante.

Eu pensava: "Fico fora de casa das 6h30 às 19h. Chego, mal dou a papinha, o banho e já coloco-a para dormir. Pouco tempo... Ela dormindo ao meu lado me dá a sensação de estar mais próxima..."

E resisti bravamente até o último domingo, quando na igreja vi um rostinho lindo no canto de uma das poltronas olhando para mim e mostrando os cinco dedos de uma mãozinha. Logo a Júlia veio me dizer que aquela pequena se chamava Maria Clara, que tinha 5 anos e era a primeira visita dela na nossa igreja. Na hora do café eu soube que ela e a mãe estavam há 3 dias dormindo nas ruas pois haviam deixado para trás uma história de violência doméstica. estavam lá buscando auxílio.

Filha, aquilo me cortou o coração! Ver a pequena Maria Clara vestir uma blusa de frio de adulto, pois não tinha como se aquecer, cortou meu coração. Ela molhava o pão no café com leite como se fosse uma iguaria deliciosa e rara. Seus olhos demonstravam ingenuidade e noção nenhuma do que estaria por vir.

Foi um dia frio, chuvoso e de muita introspecção para mim. Me senti a mais superficial das criaturas quando vi que estava "pensando se ia te colocar pra dormir no seu quarto" enquanto a Maria Clara dormia numa calçada, com uma caixa de papelão como colchão.

Naquele momento pedi perdão a Deus, porque percebi que não havia consultado Ele nessa questão... E Ele me mostrou o que eu deveria fazer por meio da vida da Maria Clara. Meu coração está numa mistura de gratidão (por tudo o que Deus faz por nós) e tristeza (por pensar no quê essa menina está passando nas ruas).

Te colocar no berço, no seu quarto, depois de um bom banho e mamadeira quente me faz refletir o quão bom Deus tem sido para nós, sendo que muitas vezes não O percebemos nos detalhes.

Espero voltar aqui para contar que essa história teve um final feliz.

Um comentário:

  1. É, Lu, tudo depende do ponto de vista. Ontem estava vendo na TV os atletas do ano e pensei que podemos ver mil coisas que não dão certo em nosso país, mas também outras tantas que dão certo. A Maria Clara estava na rua, e isso é tristíssimo, mas tem gente ajudando (vocês, por exemplo), e isso é legal.
    Sempre digo que o mundo tem conserto... e que, no fundo, no fundo, todo mundo que é gente boa quer mudá-lo.

    ResponderExcluir